FLTA na Towson: O fim da lua de mel e o início dos trabalhos como professor de português nos EUA
Semana passada completei um mês como FLTA aqui nos Estados Unidos. É claro que tudo não é mil maravilhas; às vezes bate saudades e é natural que o choque cultural nos deixe um pouco deslocados. Por isso, como a Bruna deixou bem claro aqui, para ir morar fora temos que estar muito bem psicologicamente. Nesse período é imprescindível termos uma rede de apoio e válvulas de escape como escrever, compor, andar de bicicleta, fazer academia, ir no mercado para comprar apenas um abacate, etc.
Como nos cansaram de falaram na Summer Orientation, a época até começar as aulas é considerada uma lua de mel: não temos preocupações, conhecemos lugares muito bonitos e convivemos com pessoas de todos os cantos do mundo. Pois bem, ela enfim acabou e as aulas iniciaram. Comecei o texto falando de problemas psicológicos porque essa abrupta mudança do lazer ao trabalho pode ser amarga, um fator que te deixa um pouco para baixo.
O campus da Towson University, que até então eu tinha visto como um lugar pacato, repleto de esquilos saltitantes e som de pássaros, se transformou em intensos fluxos de jovens. Alunos comendo um sanduíche em três mordidas nos intervalos das aulas, o andar apressado de pés calçando sandálias e meias, turmas saindo de salas de aula sendo ocupadas por outra logo em seguida são agora cenas do meu cotidiano.
A primeira semana de aula é chamada aqui shopping period (ou add/drop period), pois ainda é tempo de os alunos remanejarem as disciplinas que irão fazer sem custo adicional ou prejuízo na nota. Minhas aulas tiveram um impacto significativo por causa disso. A turma de Portuguese 101 começou com 12 alunos, e agora está com 16; Já Portuguese 102 tinha quatro alunos e reduziu para três.
O início do trabalho como professor de português nos EUA: as aulas
Toda a equipe de português da Towson University sou eu. Ou seja, ao mesmo tempo que tenho muita liberdade para decidir com o que irei trabalhar, a responsabilidade sobre mim é maior. As duas turmas de Português têm aulas segundas e quartas: Portuguese 101 é das 15:30 às 16:45; e Portuguese 102, das 17h às 18:16. Ao total, então, cada disciplina tem, presencialmente, 2 horas e 30 minutos semanais. Além das aulas, como professor de português nos EUA, tenho que estar disponíveis para os alunos em duas horas semanais no meu escritório (office hours).
O livro didático usado para as duas disciplinas é Muito Prazer (herdado pela última FLTA que esteve aqui). O livro é apenas um guia para os conteúdos fundamentais, o que me permite dinamizar atividades alternativas em sala de aula. Entretanto, o livro é um bom recurso para os alunos poderem estudarem em casa (ele conta com exercícios das quatro habilidades da linguagens – leitura, escrita, compreensão auditiva e fala).
A maioria dos meus alunos são de origem latina ou já falam espanhol fluentemente. A escolha pela disciplina de português se deve, portanto, na maioria dos casos, pela proximidade do com o espanhol. Quanto aos seus cursos, dos mais variados: desde Dança até Bacharelado em Química. Porém, o mais recorrente é Relações Internacionais e estão fazendo português porque, além de o curso exigir alguma língua estrangeira, dominar o português traz uma facilidade para conseguirem emprego.
Os alunos mostraram-se engajados, tornando as aulas das primeiras semanas letivas bem tranquilas. Muitos, inclusive, me perguntaram sobre aplicativos e outras estratégias que podem ser utilizadas fora da sala de aula para melhorar o desempenho linguístico.
Quanto aos equipamentos das salas de aula, não tenho o que reclamar. Tanto os computadores, quanto os equipamentos de áudio e vídeo são ótimos. Caso haja algum imprevisto, temos disponível um telefone para ligar para a assistência técnica da universidade. Se tu for um professor menos tecnológico, não tem problema: há um enorme quadro branco com canetões multicoloridos disponíveis em cada sala.
AS AULAS COMO ALUNO
Eu já estava empolgado para cursar as duas disciplinas só pelo nome delas (Geography of Blues & Rock n’ Roll e Learning and Teaching in a Diverse Society antes mesmo de olhar o cronograma). Minhas expectativas se confirmaram nessas duas semanas de aula.
A aula de Geografia gira em torno da fundamentação histórica e consolidação do blues e rock estadunidense a partir dos fatores geográficos (lugar, localização, região, movimento e interação humana com o ambiente) durante a ocupação da área do Delta do rio Mississipi. Além das leituras, temos obviamente apreciação musical. Escutamos a incrível similaridade das primeiras músicas produzidas ali com canções tribais monotônicas afro-asiáticas.
Já a aula da educação é muito lúdica e divertida. A professora Kirmani é queniana de origem indiana e propõe muitas discussões e diálogos em suas aulas, pois, como ela reforça, os professores em especial necessitam cada vez mais de uma formação multicultural e diversa. A partir de temáticas como religião, etnia, gênero, raça, iremos trabalhar essencialmente com atividades práticas. Já as leituras teóricas são tema de casa. Acredito que essa matéria é uma ótima chance de compartilhar experiências cultural, visto que além da professora, tenho também colegas de outros países, como Irlanda, Filipinas e México.
Apesar de eu estar cursando as disciplinas como ouvinte (não serei avaliado) tenho a obrigação de participar dos debates. O que me agradou nas disciplinas é que elas se contrabalanceiam. Enquanto a primeira demanda muita leitura e discussão teórica; a segunda é muito dinâmica e dialogal.
BRAZILIAN MOVIE CLUB
No dia 4 de setembro inaugurei um ciclo de cinema de filmes brasileiros. A ideia é realizar uma exibição seguida de um debate toda a primeira quarta-feira de noite de cada mês. O primeiro filme foi Que Horas Ela Volta? (The Second Mother), de Anna Muylaert.
Desde que chegamos nos Estados Unidos nos alertaram sobre problemas que (a falta de) direitos autorais pode nos acarretar. Mesmo que eu tenha um DVD, eu preciso de uma autorização para realizar a exibição, porque esta é considerada uma sessão pública, embora tenha fins educativos. Por sorte, a universidade conta com um sistema de streaming, o Kanopy, que já inclui os direitos de exibição de alguns filmes em português
A primeira sessão foi excelente. O debate sobre o filme e correlações culturais foram bem aprofundadas. Fiquei feliz quando compararam o filme com Roma, do Alfonso Cuarón.
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NADA MAIS ALÉM DE TRABALHO E ESTUDOS?
Em meio a duas semanas bem corridas, tive dois programas de lazer. No dia 2 de setembro foi o feriado de dia do trabalho nos Estados Unidos. Um dia antes, fui a Washington D.C. (45 minutos de ônibus) para passear. Em duas horas na cidade, ouvi uns 7 idiomas diferente, mas não inglês. São muitos turistas para visitar os inúmeros museus (e o melhor – gratuitos) e monumentos.
E na última quinta-feira, dia 5 de setembro, fui ao First Thrusdays Festival, promovido pela rádio universitária WTMD. Toda a primeira quinta-feira do mês a rádio organiza um festival gratuito em Baltimore, no Canton Waterfront Park, a partir das 17h. É uma baita chance para ouvir música ao vivo, com uma estrutura de boa qualidade. Dividas em dois palcos, bandas . A atração principal era XXX.
Me impressionei positivamente com as bandas que ouvi. Tocaram lá Robert Randolph & The Family Band, Super City, Emily Wolfe, Hollis Brown, Devon Gilfillian e Reality Jones. Essa impressão não foi só minha. Muitas pessoas – e seus cachorros – lotaram o parquet e aplaudiram de pé as bandas. Enfim, felizmente já sei o programa para o início dos outros meses aqui.
Até o próximo post.
Sobre o Autor:
João Pedro Amaral é professor de inglês e literatura em Santa Maria, interior do Rio Grande do Sul. Seu projeto de letramento audiovisual para alunos de escolas públicas foi vencedor do 11o prêmio professores do Brasil na categoria ensino médio da região sul do Brasil e o levou para conhecer o sistema de educação no Canadá. Em 2019/2020, João vai passar um ano letivo dando aulas de português na Towson University, nos Estados Unidos, com bolsa do programa FLTA da Fulbright.
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Sobre o autor
João Pedro
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Quem faz?
Bruna Passos Amaral é jornalista, viajante, entusiasta da educação e apaixonada por idiomas. Na bagagem, são nove intercâmbios – dois nos Estados Unidos, seis na Alemanha e um na Finlândia – e passeios por diversos países. Participe, mande relatos, perguntas ou sugestões. Os comentários no site são sempre respondidos!
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